15 de junho de 2025
OPINIÃO

Os militantes das redes sociais 3l2w42

Por Marília Martins |Especial para o GCN
| Tempo de leitura: 4 min
Reprodução

Quem nunca teve uma opinião formada sobre algum assunto do momento? Os temas são variados: fofocas de artistas, a transferência polêmica de um jogador de futebol, mas principalmente, a política e seus personagens. 5b1n20

Nos últimos anos, venho observando a dinâmica das redes sociais, que se tornaram verdadeiros diários, confessionários e, muitas vezes, fóruns de especialistas improvisados. Quem nunca opinou sobre um tema sem ter sido chamado para a conversa, simplesmente porque a discussão estava ali, ível, a um clique de distância?

Desde a popularização da internet, as relações online mudaram drasticamente. Se antes as salas de bate-papo eram espaços para fazer novas amizades, hoje os aplicativos de interação social se tornaram parte essencial da vida real, movimentando paixões e desafetos de forma cada vez mais intensa e pessoal.

Nos últimos anos, surgiu a era do cancelamento. A incapacidade de lidar com diferenças fez com que pessoas se organizassem em rede para desferir ataques e massacrar digitalmente aqueles que discordam de suas opiniões. O embate ideológico ganhou ainda mais espaço e intensidade, transformando as redes em verdadeiros campos de batalha.

Os mais jovens se arriscam ao expor suas vidas sem medo das consequências futuras. Os pioneiros das redes, hoje na meia-idade, utilizam a tecnologia principalmente para o trabalho. Enquanto isso, os mais velhos foram conquistados pela possibilidade de se conectar com familiares e desconhecidos em grupos temáticos. Se antes os excessivos "bom dia/boa tarde/boa noite" geravam impaciência, hoje, grupos intergeracionais se formam, equilibrando-se entre a paciência e o humor ácido dos memes para lidar com divergências. Mas o que acontece quando esses grupos são dominados pelo ódio e pela ignorância?

Durante minha campanha para a prefeitura em 2020, fui alvo de ataques digitais em grandes proporções. Centenas de comentários raivosos, ameaças, invasões neonazistas em comícios online — com direito a músicas de Hitler remixadas com discursos bolsonaristas — e, coincidentemente ou não, fogo na sacada do apartamento em que eu morava. Registrei tudo: prints, boletins de ocorrência e, surpreendentemente, tive o a um grupo no Facebook que coordenava esses ataques contra mim e outras pessoas que ousavam promover reflexão sobre a sociedade.

Com o então recente assassinato de Marielle Franco e outros atentados, recuei da vida pública e social, consciente de que alguns dos articuladores desses ataques eram figuras influentes da cidade, enquanto eu era apenas uma mulher que acreditava que poderia mudar o mundo com amor.
Hoje, com um mandato consolidado, acompanho a paixão com que os temas políticos são debatidos por pseudoespecialistas, sempre certos de que sabem mais que todos os outros. A manipulação da informação é consistente, pois poucas são as versões dos fatos que chegam ao público.

Minha reflexão se intensifica conforme o mundo muda. Durante a pandemia de COVID-19, mais de 700 mil brasileiros morreram, 96% sem vacina, e ainda assim há quem acredite que vacinas matam ou transformam pessoas em jacarés. Em Gaza, mais de 64 mil mortos, a maioria crianças, mulheres e idosos, e, nas redes, muitos relativizam a guerra. Donald Trump, ao ser reeleito nos EUA, quer ocupar Gaza e comprar a Groenlândia, enquanto expulsa imigrantes de solo americano — e ainda tem brasileiros que o veneram, apesar de serem por ele desprezados. Os magnatas da tecnologia se recusam a estabelecer sedes no Brasil, pois não querem responder por fake news ou crimes cibernéticos, e muitos brasileiros, desinformados, acreditam que regular as redes sociais é sinônimo de censura.

Um estudo recente feito pelo Instituto de Tecnologia de Massachusetts (MIT) demonstrou que uma falsa informação tem, em média, 70% a mais de probabilidade de ser compartilhada na Internet, pois ela é mais original que a notícia verdadeira, além de ser mais apelativa e emocionante.

O que me preocupa nas redes sociais é justamente esse cenário. Jair Bolsonaro acaba de ser indiciado pela tentativa de golpe de Estado, um plano que envolvia o assassinato do presidente e de integrantes dos Três Poderes. Ainda assim, há quem insista em chamar isso de "ditadura". O prefácio de mais uma onda de fake news já está dado: pessoas escolhendo no que querem acreditar, desconsiderando os fatos, espalhando desinformação e afastando-se de amigos e familiares por divergências ideológicas. Tudo isso antes mesmo do Carnaval.

Para quem tem redes sociais, a sugestão é manter a terapia em dia. Mas, na impossibilidade de acompanhamento profissional, cuidar da saúde mental se torna essencial para atravessar esse momento de pós-verdade, em que todo mundo tem opinião sobre o que desconhece e poucos estão dispostos a aprender. Que possamos resistir à contaminação do ódio e da ignorância, afinal, aqueles que mais espalham desinformação raramente são os que pagam nossas contas.

Marília Martins é professora, produtora cultural, foi membro do Conselho de Políticas Culturais, do Conselho da Condição Feminina e atualmente é vereadora pelo Psol.